Garota desbocada é um espaço visualmente tosco, ideologicamente irreverente, em que posto artigos politicamente incorretos sobre as minhas insatisfações e inquietações. Se quiser rir e praguejar comigo, entre e fique à vontade RS
Esta semana vi um micro vídeo com o escritor moçambicano Mia Couto. Ele disse que escrever é um caso de amor com as pequenas coisas. Achei este pensamento profundamente lindo.
Desde os 11 anos de idade escrevo regularmente. É como se compreendesse o mundo por meio da minha caneta. Achava curioso quando meus colegas de classe diziam se identificar com os meus textos, como se eu pudesse expressar o que eles sentiam e não conseguiam dizer.
Uma vez, durante o mestrado, uma colega psicóloga, que estabelecia um diálogo entre Poesia e Psicanálise, nos disse no meio de um sorriso terno que os psicólogos apenas organizavam os conceitos e ideias que os artistas conheciam há muito tempo.
Acho que a verdadeira beleza está nos detalhes. Nas coisas aparentemente pequenas. Não precisamos de grandes enredos para escrever uma boa história. Precisamos apenas de olhos atentos , ouvidos capazes de ouvir o silêncio, um coração sensível.
Precisamos ser intuitivos. Precisamos nos encantar com coisas aparentemente insignificantes para as outras pessoas. Precisamos nos emocionar com o cheiro do café , com o barulho da chuva , com o balançar das folhas das árvores, com os floquinhos de neve caindo sobre o rosto nu.
Precisamos degustar os pensamentos , apalpar as palavras, saborear as frases. Precisamos nos deliciar e fazer todo um mundo de complexas possibilidades por meio do verso de uma poesia , da letra de uma música ou de um simples sorriso.
Para escritores tudo vira tema para escrever: as manchetes do jornal, o e-mail de um amigo, um post engraçado das redes sociais, um cheiro de perfume, uma lembrança aparentemente superada que vem à tona, o gosto do bolo quente recém saído do forno.
Pois lá no fundo, o importante é escrever. O importante é dizer. O importante é sentir e palpitar e se partir e se tornar a voz dos outros. A palavra engasgada que não quer sair.
Escritores são intérpretes. Mas não traduzimos de um idioma para o outro. Traduzimos a linguagem da alma para as palavras. E de repente , o abstrato , complicado e vago ganha vida e parece simples, quase infantil de tão palpável.
Sílvia Marques é escritora, professora doutora e escreve regularmente na Obvious. Viciada em café, chocolate, vinho barato, dias nublados, filmes bizarros e pessoas profundas.
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