quarta-feira, 16 de março de 2016

Tire as mãos das minhas ressignificações!

Garota desbocada é um espaço visualmente tosco, ideologicamente irreverente, em que posto artigos politicamente incorretos sobre as minhas insatisfações e inquietações. Se quiser rir e praguejar comigo, entre e fique à vontade RS
 
A boa e velha sabedoria popular afirma há milênios que quem não atrapalha, já ajuda. Sim! Se não pode ajudar, não atrapalhe! Se não tem nada de agradável ou útil para dizer, feche a boquinha.
 
Cada um sobrevive como pode neste mundo de meu Deus. Cada um interpreta os fatos mais dolorosos e mais prazerosos da própria vida como melhor lhe convém para não afundar a cabeça no vaso sanitário ou não tomar um frasco de água sanitária.
 
Cada um ou pelo menos muitos de nós conseguimos sobreviver às tragédias da vida de uma forma muito subjetiva.
 
Pouco me importa a interpretação maldosa de quem não quer me ajudar ou até quer, mas não sabe. É. Nem todo mundo tem competência para dizer as palavras certas nas horas mais erradas da vida das pessoas.
 
Tem gente que abre a boca diante de um depressivo, de um surtado, de um desesperado qualquer e praticamente induz o coitado ao suicídio. Tem gente que consegue dizer a última coisa que um desesperado precisa ouvir no pior momento da sua vida. Entre tantas coisas que uma pessoa pode dizer, o cidadão consegue tirar do fundo da cartola o que mais vai derrubar quem já está com a cara colada no chão, lambendo água de sarjeta.
 
Consolar é um dom raro. Sim, nem todo mundo sabe consolar e não há problema algum nisso. Ninguém é obrigado a saber consolar.  Não depende de boa vontade apenas. É preciso ter uma sensibilidade estupenda e uma capacidade de se colocar no lugar do outro fora do comum. Coisa que não está muito em moda. Coisa que nunca esteve em moda, pois o barato mesmo está em julgar e projetar, jogando todas as nossas merdas em cima do primeiro infeliz que atravessa o nosso caminho. 
 
Mas a gente precisa tomar mais cuidado antes de sair dizendo qualquer coisa como se a língua fosse uma metralhadora giratória.  O que para a gente são apenas palavras, pode se materializar num sofrimento intolerável para quem já está mal.
 
Às vezes, um abraço pode ajudar muito quando não sabemos o que dizer.  Ou um simples "Eu te entendo".  Ninguém é obrigado a encontrar uma solução para a vida do outro, mas um pouco de carinho e solidariedade sempre contam muito no sentido positivo da palavra.
 
Temos que tomar cuidado para não interpretar a vida do outro a partir da nossa vida, da nossa subjetividade. Por tal motivo, analistas falam pouco. Fazem perguntas para estimular o paciente, mas não entregam respostas prontas.  Pois ninguém pode interpretar a nossa vida no nosso lugar.
 
Lacan dizia que todos nós deliramos. Pois cada um de nós interpreta a sua realidade a partir da sua subjetividade. E ninguém tem o direito de botar as mãos enlameadas na subjetividade do outro. Ninguém tem o direito de enfiar goela abaixo uma "verdade" que o outro não pode suportar. Uma "verdade" que não é a verdade da pessoa que passou por uma experiência dolorosa. Ninguém tem o direito de usar o sofrimento do outro para reafirmar as próprias crenças e "loucuras".
 
Lá no fundo, o que aconteceu ou o que deixou de acontecer não importa tanto assim. O que conta para valer é o que a gente conta para nós mesmos. É aquilo que a gente consegue extrair de cada experiência vivida ou imaginada. Existem aqueles que inclusive acreditam que a vida imaginada é tão real quanto a vivida e que a vida real não passa de uma imaginação.
 
Por tal motivo, para alguns o copo está meio cheio e para outros meio vazio. Por tal motivo, alguns enxergam um ponto branco no centro do quadro negro e outros enxergam o quadro negro. Por tal motivo, algumas pessoas olham para o escuro do céu e outras para o brilho das estrelas.
 
Já dizia Nietzsche..."não existem fatos, mas sim interpretações". E cada um recheia o bombom da vida com aquilo que melhor lhe apetece. Muitos recheiam com tristeza. Pensamento estranho? Nem tanto... se a gente parar para pensar, a tristeza é poética. Sim...muito...Que vontade de tomar um Martini bianco bem gelado com um jazz ao fundo!
 
 
 
 
 
 
 

Sílvia Marques é escritora, professora doutora e escreve regularmente na Obvious.  Viciada em café, chocolate, vinho barato, dias nublados, filmes bizarros e pessoas profundas. 








 
 
 
 
 
 
 

2 comentários:

  1. Ola Silvia!
    Como nao tenho nenhuma das redes sociais necessarias pra comentar na obvious, comento aqui.

    A partir de meus olhos, cabeça e coração, vi uma pertinência contundente de seus dois textos, esse aqui e o do cordeiro em pele de lobo, ao que vivemos hoje no Brasil, seja politica ou existencialmente.

    Se todo mundo fosse alem e se questionasse esses conceitos, as formas de percepção das coisas, a busca pela verdade a gente veria uma debate mais profundo. E nao so ataque, acusação e a imediata necessidade de pontuar um Cristo pra tudo que esta acontecendo. Todo mundo tem teto de vidro, em menor ou maior escala. Dizer isso nao exclui o fato de que o tiver que ser feito para esclarecer, deve ser feito. So acho que a energia toda deve tambem ser usada pra auto-critica, pra protestar, falar, espernear e mudar nossos universos imediatos.

    Veja bem, nao sou a favor de um determinado partido ou governo, sou a favor do Brasil, que a gente possa abrir um sorriso em ver a engrenagem funcionando, sem vícios.

    Desculpe, mas meus olhos de hoje e coração angustiado de brasileira leram seus textos e foi inevitavel essas ideias ai pipocarem na cabeça ... :)

    ResponderExcluir
  2. O texto fala sobre subjetividade , Carol. Vc tem todo o direito de fazer as suas conexões! O Garota desbocada fala de política de forma mais indireta, mas seu debate é válido. Hj, mesmo em sala de aula, estimulei um debate a respeito com os meus alunos. Foi muito bom!

    ResponderExcluir