sexta-feira, 4 de março de 2016

Sobre escrever-parte II

Garota desbocada é um espaço visualmente tosco, ideologicamente irreverente, em que posto artigos politicamente incorretos sobre as minhas insatisfações e inquietações. Se quiser rir e praguejar comigo, entre e fique à vontade RS
 
 
Muitas pessoas  acham surpreendente quem escreve regularmente. Eu acho surpreendente quem consegue se localizar num bairro desconhecido.  Já me perdi na região de casa...na época em que ainda dirigia, uma vez tive que ser escoltada pelo meu pai...para os mais críticos, uma situação ridícula. Para os mais bem humorados, engraçada. Sim, foi ridículo e engraçado ao mesmo tempo.
 
Me surpreendo com os dentistas! Meu Deus! Como eles conseguem fazer implantes e restaurações num espaço tão pequeno! Me surpreendo com quem faz cirurgia de um modo geral, pois não posso ver uma gota de sangue sem dar um chilique básico.
 
Sempre me lembro de um dia , na escola, em que vi uma mancha esverdeada no meu braço. Mostrei a mancha à minha amiga ( atualmente ela é dentista) e ela disse com a maior calma do mundo que eu tinha estourado uma veia. Eu devo ter esbugalhado os olhos e com a jugular pulsando, eu respondi em pânico: "Como? Eu estourei uma veia?" Eu não entendi na hora como ela poderia estar tão calma. Eu tinha estourado uma veia! RSRS
 
Passei tão mal que a escola ligou para a casa e minha mãe me buscou. Esta história me envergonha mais do que a da escolta.
 
Devo ter estourado uma veia carregando a mochila absurdamente pesada. Um espécie de bedel da escola, muito gentil,  me acompanhou até a saída e carregou a minha mochila. Ele devia ter 2 metros de altura e ao colocar a minha mochila no ombro, se assustou com o peso.
 
Mas voltando ao ato de escrever...muitas pessoas sentem curiosidade em saber o que move um escritor, o que faz um escritor escrever. Não posso responder por todos. Então, responderei por mim já que este é o meu espaço. Já que o Garota desbocada é o meu banheiro literário.
 
Escrevo porque estou triste. Escrevo porque estou feliz. Escrevo porque tenho esperança de que as minhas palavras se materializem. Escrevo porque desisti de esperar e sonhar.
 
Escrevo porque o dia é cinzento e me inspira. Escrevo porque o dia está ensolarado e me irrita. Escrevo porque estou cansada de viver. Escrevo porque estou cansada de não viver.
 
Escrevo porque é manhã e me sinto disposta. Escrevo porque é noite e preciso fazer um balanço do dia. Escrevo porque tomei muito café e estou agitada. Escrevo porque o café acabou e estou entediada.
 
Escrevo porque é dia de festa. Escrevo porque é dia de luto. Escrevo porque é um dia banal e quero torná-lo especial.
 
Escrevo porque não tenho mais nada a fazer. Escrevo porque não sei fazer nada melhor.
 
Escrevo porque deixei o trem da esperança passar. Escrevo porque acredito num mundo melhor. Escrevo porque o bolo insiste em não assar e o leite em não ferver. Escrevo porque o leite se derramou pelo fogão e eu odeio limpar.
 
Escrevo porque diz que me ama. Escrevo porque me ignora. Escrevo quando me tira para dançar. Escrevo quando durmo só em minha cama. Escrevo para matar o tempo. Escrevo para ficar na História.
 
Escrevo quando tudo é tédio, silêncio, penumbra. Escrevo quando tudo são cores e gemidos tépidos. Escrevo quando tudo é gozo dolorido e alegria. Escrevo porque tenho tempo. Escrevo porque sinto que o meu tempo já passou.
 
Escrevo para desabafar. Para irritar. Para me irritar. Para inspirar, exorcizar , esfoliar a alma. Escrevo por vício, por costume , por paixão. Escrevo para me manter sã. Escrevo porque sou insana.
 
Escrevo porque as folhas caem. Porque as flores desabrocham. Porque sei que do outro lado do planeta há nevascas. Porque o sol insiste em brilhar. Escrevo porque sei que outras pessoas choram. Escrevo porque a vida é trágica. Escrevo porque a vida é sonho.
 
Escrevo porque sinto um perfume no ar e me recordo de uma lembrança antiga.  Escrevo quando sinto cheiro de caramelo. Quando sinto gosto de pudim de leite , paçoquinha. Escrevo porque uma música me descontrola. Escrevo porque estou meio morta. Escrevo porque estou viva.


 
 

Sílvia Marques é escritora, professora doutora e escreve regularmente na Obvious.  Viciada em café, chocolate, vinho barato, dias nublados, filmes bizarros e pessoas profundas. 

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