sábado, 26 de setembro de 2015

É fácil prestigiar os medíocres

Garota desbocada é um espaço esteticamente tosco, ideologicamente irreverente, em que posto artigos sobre as minhas insatisfações e inquietações. Se quiser rir e praguejar comigo, entre e fique à vontade RS
 
Ri ao ler um post no Facebook semana passada. Era algo mais ou menos assim: você zomba de quem acredita em astrologia , mas você acredita em meritocracia.
 
É muito fácil prestigiar os medíocres, os que não ameaçam, os que não alçam voos altos. Águias precisam ter asas podadas e  necessitam ser encarceradas em gaiolas. E brindemos às galinhas ciscando suas migalhas de cautela e moderação.
 
É fácil avisar um amigo mais ou menos inteligente de um processo seletivo. É fácil apresentar uma amiga mais ou menos interessante ao namorado. É fácil oferecer uma promoção para alguém sem autonomia para tomar decisões sozinho. É fácil elogiar e incentivar quem não nos ameaça de fato.
É fácil oferecer chances para quem não vai te superar.
 
Concordo que precisamos desenvolver o nosso instinto de sobrevivência e ninguém tem a obrigação de atirar o parceiro nos braços de uma amiga gostosa. Mas , quando esta tendência de prestigiar e dar oportunidades ao mais inexpressivos atinge a esfera profissional a coisa fica muito nociva, para não dizer baixa.
 
Se um chefe poda os mais dedicados e criativos em favor aos café com leite , sem brilho e sem iniciativa, para não ser ofuscado por um subalterno mais competente, quem paga o pato não é apenas o profissional prejudicado. A empresa como um todo sente os efeitos de uma escolha invejosa.
 
Se um professor boicota seus alunos mais brilhantes por despeito autoritário ou se num projeto profissional por receio de ser eclipsado, o coordenador escolhe colegas meia boca , dá um tiro no próprio pé. Imaginem um ator que escolhe apenas intérpretes mais ou menos para encenar uma peça? Ele até pode se destacar por ser o menos pior, mas a encenação provavelmente não agradará. O mesmo se diz a respeito de alguém que vai publicar um livro coletivo e escolhe como bom escritor apenas a si mesmo. Seu trabalho pode ser apreciado, mas o projeto afundará na merda por falta de parceria de qualidade.
 
Enfim, a inveja é uma via de mão dupla, em que algum tiro sempre sai pela culatra.
 
Sílvia Marques é escritora, professora doutora e escreve regularmente na Obvious. Viciada em café, chocolate, vinho barato, filmes bizarros e pessoas profundas.
 
 
 


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