terça-feira, 2 de maio de 2017

Uma diva francesa

Garota desbocada é um espaço visualmente tosco, ideologicamente irreverente, em que posto artigos politicamente incorretos sobre as minhas insatisfações e inquietações. Se quiser rir e praguejar comigo, entre e fique à vontade RS



Em alguns dias , me sinto meio Coco Chanel, meio Gabrielle Collete. Enfim, qualquer mito da cultura francesa que veio ao mundo para ser mais do que uma silhueta e um biquinho sexy.

Em alguns dias, me sinto totalmente confortável com a versão que arrumei de mim mesma. Tão confortável quantos pés cansados que calçaram pantufas ou um corpo um pouco acima do peso que se esconde numa camisola larga. 

Em alguns dias , tomo o meu café compulsivamente sem pensar nos malefícios do excesso de cafeína ( quase sempre faço isso!) e me sinto perfeitamente bem eu ser eu mesma ou o que eu imagino ser ou ainda o que eu finjo ser. Ás vezes, a gente mente tão bem que até mesmo nós acreditamos em nossa anedota e a levamos a sério e acreditamos não precisar mais de terapia pois já nos encontramos , pois já dominamos a arte de ser quem somos ou quem deveríamos ser.

Em alguns dias, bebo meu vinho branco tranquilamente , com pensamentos brandos , de uma filosofia leve e flutuante que mais me traz certezas do que perguntas. 

Em alguns dias, posso ler um livro como O amante de Marguerite Duras em poucas horas, com o descuido de quem tem todo o tempo do mundo para fazer o que bem entender.

Gosto de sair no meio da tarde , dia de semana ou passar a noite fora de casa, bater papo até a madrugada , pensando em todos que já estão dormindo pois precisam levantar às seis da manhã. 

Gosto de me sentir uma artista do cotidiano , pintando com cores estridentes a minha vidinha cinza. Gosto de espalhar as tintas com as mãos espalmadas , um riso frouxo e um olhar zombeteiro, típico daqueles que transformam a própria existência numa poesia concreta. 

Gosto de apostar em mim mesma e viver meus ideais , todos bem gelados numa taça de champanhe que bebo cheia de passionalidade.

Creio no que sinto. No pulsar da jugular. Adoro cismar que algo é bobo e depois comprovar que realmente o é. Não há nada mais sublime do que desenhar as próprias verdades e caminhar por uma trilha nunca antes pisada por pés banais. Detesto a banalidade. Banalidade como falta de criatividade , como produto de uma mente mecânica. Gosto da banalidade como pleonasmo do amor. Como a repetição infantil dos pequenos grandes gestos de amor.

Caminho o meu caminho. Um caminho que é só meu e entre livros de sebo, copos vazios , filmes dançando em minha memória, me abandono a mim mesma : ao que sei , ao que gostaria de saber , ao que deveria saber , ao que nunca saberei um dia. Me abandono à minha arte , à minha poesia , ao meu conhecimento, à minha ignorância , à minha sabedoria que é saber que sou ignorante , louca e arrogante. 

Sinto seu cheiro de cigarro em minha mente e desejo um beijo. Um beijo sobre lençóis amarfanhados , a pia da cozinha por arrumar. 

Sento-me diante da tela em branco do computador. Sinto saudade do calo que tinha no dedo de tanto escrever quando era apenas uma menina de cem anos de idade. Olho para trás e aspiro apenas os pensamentos gentis. Estranhamente , me sinto em medidas iguais , perdida e feliz. 





































Sílvia Marques é escritora, professora doutora e escreve regularmente na Obvious.  Viciada em café, chocolate, vinho barato, dias nublados, filmes bizarros e pessoas profundas.










2 comentários:

  1. Que dias são esses que se sente Coco Collete? Que dias são esses que se sente você?
    Que dias mente e que dias leva a sério? Quais são os dia do vinho e da certeza?
    E quais são as tardes que vc parte ao meio?
    Se tens o tempo todo do mundo, pra quê Duras?
    Tens O Sentimento do Mundo de Drummond!

    Bate papo, bate taça de champanhe, de paixão frouxa e riso cheio! De madrugada acordando os de vidinha cinza.
    Antes das 6 tropeças em cacos de livros, filmes vazios, espalhados na pia e em poesias amarfanhadas que gostariam de um beijo e um cheiro de sabedoria!
    Sinto saudade do colo da menina de cem anos e dos pensamentos estranhos. Felizmente, ainda há vinho nas taças. E os dias continuam com a mesma banalidade passional como num quadro de Gauguin.

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    1. Qualquer resposta minha , muito extensa , estragaria o seu comentário. Deixo a luz do palco para a sua poesia enquanto fumo meu cigarro imaginário RSRS

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